Ciência

Terapia Psicadélica Sem a “Viagem”: Realidade ou Ilusão?

Bryan Roth, farmacologista da Universidade da Carolina do Norte (EUA), é um, entre muitos, à procura do que parece ser o novo El Dorado na luta contra a depressão. Com financiamento da Agência de Projetos de Pesquisa Avançada de Defesa (DARPA), ele e a sua equipa estão à procura de novas moléculas que, tal como nos psicadélicos, tenham como alvo os recetores de serotonina 5-HT-2A, mas sem o efeito alucinogénio. O objetivo, explica numa entrevista à Forbes, é “encontrar compostos que sejam terapêuticos e não psicadélicos”, que possam melhorar o tratamento das atuais 100 milhões de pessoas em todo o mundo com depressão resistente à medicação.

Um estudo publicado na Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), em Abril neste ano, parece concluir que esta é uma possibilidade viável. A equipa da Universidade de Maryland (EUA) usou, como modelo animal, ratinhos com sintomas depressivos, administrou-lhes medicação capaz de bloquear os recetores de 5-HT-2A – que se acredita que precisam de ser ativados para se verificarem os efeitos psicadélicos – e administrou-lhes uma injeção de psilocibina. Os animais desenvolveram conexões neurais mais fortes no hipocampo, semelhantes às observadas com o uso de antidepressivos mais tradicionais. “A conclusão provisória do nosso estudo”, declara Natalie Hesselgrave, a primeira autora do estudo, à Lucid News, “é que a trip não é necessária para o efeito antidepressivo.”

Muitos investigadores acreditam que só eliminando as características alucinogénias destas moléculas é possível que elas venham a tornar-se um tratamento de primeira linha, passível de ser administrado em casa, como os atuais antidepressivos. As barreiras mais mencionadas à manutenção da trip psicadélica são o medo que muitas pessoas sentem de a vivenciar, o facto desta não ser aconselhável a quem tenha uma história clínica de psicose ou esquizofrenia e ainda o investimento – de tempo, de meios humanos e, como tal, de custos – que implica. Estas características podem impedir que haja um acesso mais amplo e democratizado a estas substâncias, pelo que eliminar a trip, mantendo os restantes efeitos, apresenta-se como uma possível solução.

No entanto, esta visão não é unânime. Do outro lado da barricada, nomes de peso como Rick Doblin, fundador do Multidisciplinary Association for Psychedelic Studies (MAPS), e Robin Carhart-Harris, diretor do Center for Psychedelic Research, do Imperial College London, tem dúvidas sobre a utilidade dos chamados ‘compostos psicadélicos não psicadélicos’. Argumentam que, para além deste caminho contribuir para um atraso na ajuda àqueles que precisam dela neste momento, dificilmente os efeitos benéficos serão os mesmos, já que a experiência psicadélica é uma parte essencial do potencial terapêutico destas substâncias.

Num artigo de análise publicado na Mind Foundation, Vlad Nicolescu, dá voz aos principais argumentos daqueles que se mostram céticos: o fluxo de pensamentos, emoções e imagens que decorrem da trip, o sentido profundo e significativo que o psiconauta lhe atribui e a ocorrência de uma experiência mística estão profundamente correlacionados com os efeitos terapêuticos. Na sua opinião, são estes fatores, a subjetividade humana, que atuam no âmago da depressão ou do trauma. Optar por soluções que a evitem, de forma a não lidar com as suas complexidade de implementação, pode ser o caminho para arruinar o potencial destas drogas, tornando-as em substâncias não muito diferentes das que já existem e, portanto, como o mesmo problema de falta de eficácia.

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