Ciência

Natureza, Psicadélicos e Transformação Pessoal: Existirá um Efeito Sinérgico?

Embora sejam precisos mais estudos para clarificar a relação dose-duração-resposta, existe atualmente uma considerável evidência científica a sugerir que a exposição à natureza pode contribuir positivamente para a saúde mental. A literatura reporta ainda benefícios ao nível da atenção e cognição, memória, stress e ansiedade, sono, estabilidade emocional e auto-percepção de bem-estar ou qualidade de vida. Simultaneamente, têm vindo a ser progressivamente estudados os efeitos dos psicadélicos na saúde mental, sugerindo que estes parecem ter resultados benéficos, por exemplo, no tratamento da depressão severaansiedade e stress pós-traumático.

Cruzando estas informações é possível formular algumas questões para futura investigação: Poderão, psicadélicos e contacto com a natureza, ter efeitos sinérgicos na melhoria da saúde mental e outros efeitos associados aos psicadélicos? Se sim, quais as características desta associação? E quais os mecanismos que poderão explicar tais resultados? 

Para procurar responder a estas e outras questões, Gandy e colaboradores publicaram um artigo onde, realizando uma revisão crítica sobre a literatura já existente, discutindo a evidência científica dos benefícios na saúde mental do contacto e relacionamento com a natureza; os potenciais benefícios sinérgicos para a saúde mental decorrentes do contacto com a natureza e uso de psicadélicos; e finalizam formulando hipóteses relativamente a como potenciar o relacionamento com a natureza com recurso ao uso de experiências psicadélicas.

Entre os argumentos explicativos podem estar os seguintes: de natureza neurobiológica – ambos parecem reduzir a ruminação e atividade em áreas do cérebro associadas à depressão; de natureza psicológica – ambos parecem promover maior conexão, reduzir o afeto negativo, e o contacto com a natureza parece também ser facilitador de um estado de atenção plena (“mindfulness”) e da ocorrência de uma experiência mística); e relacionados com a personalidade – o traço de personalidade ‘abertura’ parece aumentar de forma estável com o uso de psicadélicos e está fortemente correlacionada com o contacto com a natureza.

Se tanto psicadélicos como o contacto com natureza podem ter um efeito terapêutico, e tendo em conta a sua potencial interação, intervenções com recurso a psicadélicos e protocolos realizados em meio natural poderiam provocar um aumento deste efeito. Para o efeito, os autores sugerem que o planeamento das sessões poderia progredir de ambientes interiores/artificiais (que oferecem mais controlo, conforto e segurança) para ambientes exteriores. Indicam também que tanto as sessões de preparação como de integração, mesmo que não realizadas em ambiente exterior, poderiam incluir alguns elementos de imersão na natureza, tornando a perceção dos aspetos sensoriais associada à experiência mais rica e envolvente do que o normal. 

Em alusão a esta potencial sinergia entre natureza e psicadélicos, já Albert Hofmann dizia que uma das suas experiências mais gratificantes foi ouvir as pessoas dizerem: “Eu cresci na cidade mas, assim que tomei LSD pela primeira vez, voltei para a floresta.”

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