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R. Gordon Wasson

Robert Gordon Wasson (1898 – 1986) foi um etnomicologista e um grande um apaixonado por fungos. Wasson queria ajudar os outros a aprenderem mais sobre os medicamentos psicadélicos naturais, aos quais ele preferia chamar de enteógenos, ou seja, plantas e fungos que manifestam o divino interior. As suas expedições de campo e a sua investigação eram cuidadosas, e quando combinadas com as suas brilhantes habilidades interpessoais e respeito pelos povos indígenas, levaram a importantes descobertas sobre como a humanidade usa os enteógenos desde a antiguidade. 

Wasson foi banqueiro de investimentos em Danbury, no Connecticut, mas a sua esposa, que era Russa e médica de formação, partilhou com ele o seu amor por cogumelos, numa descoberta intrigante na sua lua de mel. Os trinta anos de investigação que realizaram levaram à descoberta científica da tradição esquecida do uso de cogumelos psicadélicos para fins de cura espiritual pelos índios mazatecas das montanhas ocidentais de Sierra Madre, no México. Gordon Wasson e a sua esposa investigaram os cogumelos e aprenderam com Robert Graves e Hans Mardersteig sobre o uso de cogumelos sagrados entre os povos indígenas nas culturas mesoamericanas.

Wasson contactou com Richard Evans Schultes no Museu Botânico de Harvard, tendo este lhe faculdado o seu artigo de 1939, baseado nas suas expedições de campo com Blas Pablo Reko, mostrando que a medicina sagrada dos astecas, teonanacatl, era um cogumelo contendo psilocibina. Quando Cortez conquistou o México, os seus seguidores repararam que os astecas ingeriam cogumelos num contexto religioso e chamavam-nos de “corpo de Deus” ou teonanacatl. Wasson estudou obras de arte daquela região com mais de mil anos, como por exemplo, cogumelos esculpidos em pedra na Guatemala. Outro exemplo é o do príncipe asteca das flores, que surge como uma figura masculina sentada, esculpida em pedra durante o século XVI, com cogumelos estilizados no seu corpo, juntamente com tabaco, glória-da-manhã (ipomoea purpurea) e algo chamado de heimia salicifolia, um arbusto com qualidades medicinais.

Emblemático número da revista Life que fez explodir o interesse do mundo ocidental pelos cogumelos mágicos

De 29 a 30 de junho de 1955, Gordon Wasson e o fotógrafo Allan Richardson foram os primeiros ocidentais a participar na cerimónia do cogumelo sagrado, sob a orientação da curandeira Maria Sabina. Os dois viajaram para a comunidade indígena Mazatec de Huautla de Jimenez, a 1600 metros de altitude, nas montanhas de Oaxaca, uma viagem que incluiu um voo angustiante e vários quilómetros a cavalo. Wasson contactou um governante daquela zona e usou a pronúncia correta da palavra para descrever os cogumelos, tendo assim conseguido informação do lugar onde os cogumelos cresciam e onde ele os podia colher. Foi depois apresentado a Maria Sabina, que liderou a cerimónia com a sua filha, e que incluiu muitos membros da tribo.

Um artigo na revista Life em 13 de maio de 1957, da a sua autoria, descreveu como o ritual tinha um carácter de reverência e que tinha vários tipos de restrições. Os cogumelos eram colhidos por uma virgem na lua nova antes do amanhecer, consagrados num altar numa igreja católica, e depois comidos frescos aos pares. Antes da cerimónia, os cogumelos eram mantidos sobre incenso de copal, e eram conhecidos como “os pequeninos que brotam”, e nesta comunidade acreditava-se que o espírito de Cristo surgia através dos cogumelos, chamado pela curandeira através das suas orações cantadas. “Eles levam-te onde Deus está”, diziam os Mazatecas. Os cogumelos eram tratados com respeito e eram considerados uma bênção a este povo por serem pobres. A curandeira comeu 13 pares e Wasson disse que lhe serviram 6 pares. O etnomicologista escreveu que ficou maravilhado e que teve visões mais encantadoras e reais do que a vida comum, e de viagens magníficas e de beleza arrebatadora.

Antes de o artigo ser publicado, Wasson repetiu a experiência três dias depois e teve visões de pessoas noutro mundo, e sentiu a sua consciência como se estivesse desligada do corpo. Seis semanas depois, Gordon Wasson ainda tinha alguns cogumelos secos e afirmou que eles ainda mantinham toda a sua potência. Enquanto escrevia o artigo, Wasson estava já na sua quinta viagem até àquela comunidade, e traduziu as palavras das orações de Maria Sabina durante as cerimónias a que foi assistindo.

Em 1956, o investigador fez-se acompanhar por um químico e um antropólogo, além de contar com um importante micologista, o seu amigo Roger Heim, diretor do Museu Nacional de História Natural de França, para ajudar a catalogar e identificar os cogumelos. Roger Heim ilustrou em aguarelas as sete variedades diferentes de cogumelos divinos que eram usados, quatro dos quais nunca tinham sido visto antes. Eles colaboraram depois na escrita de livros sobre esta descoberta. Heim cultivou também variedades suficientes que permitiu depois, em 1958, que Albert Hofmann sintetizasse psilocibina e psilocina apartir destes cogumelos.

Gordon Wasson ficou também intrigado com a forma como os primeiros exploradores humanos teriam descoberto os efeitos fantásticos desses cogumelos e como as culturas indígenas de todo o mundo criaram práticas e rituais, e até religiões, em torno destas experiências. Wasson escreveu que os efeitos dos enteógenos “só poderiam ter sido profundos, um detonador de novas ideias”. No seu livro de 1968, Soma: Divine Mushroom of Immortality, ele realizou um estudo aprofundado com investigação cuidadosa sobre a presença de referências da medicina sagrada Soma, no Rig Veda, o mais antigo dos Vedas – quatro textos sagrados do hinduísmo. O Rig Veda está repleto de invocações ao Soma que ele concluiu serem homenagens ao cogumelo amanita muscaria. Embora tivesse permanecido em uso na Sibéria, o seu uso tinha desaparecido há milhares de anos na Índia, o que era um mistério, pois práticas como ioga, canto devocional, meditação, oferendas aos templo, e alimentos cerimoniais estavam presentes na tradição.

O antropólogo médico chileno, Claudio Naranjo, argumenta que Soma é mais provável que seja peganum harmala, também chamada de arruda síria, que contém harmalina e harmala, como a ayahuasca. Gordon Wasson fez uma investigação cuidadosa sobre o uso siberiano de amanita muscaria, e até experimentou ele mesmo mas sem experienciar os efeitos desejados.

Gordon Wasson com a sua esposa, Natacha Wasson

Em 1978, o etnomicologista ajudou a escrever um grande trabalho mostrando que os antigos mistérios gregos no Elêusis envolviam uma potente bebida psicadélica chamada de kykeon, que evocava uma visão que permitia aos participantes entenderem a continuidade da vida e a celebrarem o ciclo eterno do regresso da primavera. Estas peregrinações ocorreram desde o ano 1600 ac até ao ano de 392 dc, como um festival anual que celebrava os mitos de Deméter e Perséfone. Wasson escreveu o livro The Road to Eleusis: Unveiling the Secret of the Mysteries com Carl Ruck, professor de estudos clássicos da Universidade de Boston, e com Albert Hofmann, o químico que descobriu o LSD e que sintetizou a psilocibina.

As suas investigações no âmbito deste livro através de escritos antigos e representações artísticas, indicaram que o sacramento arcano era um potente enteógeno, provavelmente uma solução de variedades de cravagem claviceps paspali ou claviceps purpurea que teriam crescido nas proximidades das Planícies Rarianas no Elêusis. Variedades de cravagem de trigo e cevada podem conter alcalóides alucinogénicos solúveis em água, e que os gregos poderiam beber como uma libação que não teria os alcalóides nocivos tão perigosos no envenenamento por cravagem.

Os psicadélicos são frequentemente chamados de enteógenos, que significa algo que ajuda a evocar uma consciência de Deus ou da presença consciente superior. É um termo que o Ruck, Gordon Wasson, Jonathan Ott e outros ajudaram a desenvolvernum artigo de 1979. Os enteógenos podem oferecer uma renovação extática que dá um significado mais profundo às nossas vidas e uma apreciação da realidade magnificente que existe dentro de nós mesmos, na natureza, e nos nossos semelhantes.

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